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sexta-feira, 29 de abril de 2011

Cobiçado Luxo


No meu, no seu e no nosso ponto de vista, na maioria das vezes, o consumo de luxo está menos associado à funcionalidade ou aos benefícios práticos gerados por um determinado produto; e mais conectado às sensações causadas pela experiência da compra e uso desse artigo luxuoso.




Por esta razão, o conceito de luxo não pode ser atribuído apenas ao produto ou serviço em si. De modo geral, o luxo pode ser considerado uma característica superior ou um atributo distintivo positivo, de caráter sócio-antropológico, que faz alguém ou algo se sobressair em relação a outros e, também, uma força motriz na indústria de bens de consumo.
O consumo do luxo é de natureza emocional, uma vez que ele desperta o que existe de mais irracional nos seres humanos: o desejo. A idéia de luxo está relacionada à representação das desigualdades sociais, ao supérfluo, à ostentação, opulência e à futilidade; é um produto da ganância humana. Mas, ao mesmo tempo, é uma característica daquilo que é requintado e aprimorado; algo que proporciona conforto e aumenta o prazer; ele representa as difíceis conquistas, a busca pelo impossível e pela superação, a satisfação individual.





Essencialmente, o luxo tem caráter de exclusividade, refinamento, sedução, prestígio, raridade e acesso restrito, cujo consumo representa uma condição ou fruto do privilégio de alguém que anseia de acordo com seu contexto, suas possibilidades e, principalmente, impossibilidades. Ele existe desde o princípio da história da humanidade e pautou muito do que formou a hierarquia de classes sociais e a disputa de poder entre os povos.
Um dos maiores desafios para o mercado de luxo é superar a crença religiosa de igualdade social e humildade, uma vez que é preciso convencer aos consumidores de que eles são merecedores desse raro prazer e que podem se permitir ao perdão por um consumo supérfluo, praticando a “auto-indulgência” e rendendo-se aos apelos do objeto de desejo.





Conforme LIPOVETSKY (2005), em "Luxo Eterno", “a arte de viver que acompanha o luxo não é mais uma convenção de classe, é teatro para melhor provar dos prazeres dos sentidos”. Contudo, o autor não se refere apenas aos cinco sentidos, mas também a um sexto e fundamental: o tempo. Ele acredita que, mesmo num período em que o presente é muito valorizado, o luxo almeja a eternidade. Do efêmero, extrai-se o eterno.
A hipótese de que o luxo comunica a natureza do sagrado — apesar de seu sentido aparentemente contraditório — tem sido explorada por diversos autores, tais como o próprio Gilles Livovetsky (2005) "Tanto quanto uma luta simbólica intra-humana, o luxo foi uma maneira de garantir os ciclos da reencarnação, um combate mágico contra o tempo e o perecível. Foi menos um processo de negação das coisas e submissão danatureza pelo qual o homem afirma sua subjetividade que sustentou os comportamentos suntuários do que um processo de apropriação das forças do além em vista do renascimento, um processo de captação de poderes paracombater a finitude das durações terrestres" (LIPOVESTKY, 2005: 81-82).



O jornalista Jean Ferreux (2006) "Consideramos, efetivamente, que o luxo é uma angústia existencial e uma fuga diante do mundo. Angústia existencial e sentimento do sagrado são duas faces da mesma tomada de consciência de nossa finitude. Ora essa tomada de consciência pode, por (e para) alguns, receber uma resposta quase mágica: a construção de um mundo (que se queira/que se creia) protegido. O luxo seria então para aqueles que tenham a possibilidade – este termo tomado no sentido que lhe dá estatística – de serem ricos, a de viver num mundo artificial, à margem do mundo real do qual temos a ilusão de que escaparemos" (FERREUX, 2006: 18), e o poeta Jair Santos (2006), uma vez que tanto Deus, quanto o luxo, estão na dimensão do desejo, da utopia. Ambos são recursos utilizados pelos seres humanos que visam saborear outra realidade: a vida eterna.




Jean Ferreux (2006:17-18), editor da Téraèdre Publishing, classifica o Luxo Clássico como Concepção Intensiva e o Novo Luxo como Concepção Extensiva, para os quais o luxo tem significados distintos. Na Concepção Intensiva, o luxo representa o único, significa ter (para mostrar ou gastar) o que os outros não têm; é raro, logo caro; beneficiário daquele que dele se beneficia; marketing eventualmente posterior; imaginário seguido pelo beneficiado.
Conforme a Concepção Extensival, o luxo tem aspecto múltiplo, significa ter o que os outros eleitos têm; é caro por estratégia, mas não raro, só “seletivo”; no plano financeiro, os beneficiários são aqueles que fabricam, já no plano simbólico, os favorecidos são os compradores; o imaginário é o utilizado ou mesmo manipulado pelo fabricante.
Para Jair Santos (2006: 167), “o ‘sonho de consumo’ é, na verdade a miragem do nosso auto-retrato elitário”. Segundo ele, esse aspecto a se tornar ostensivo envolve, mais do que uma economia, uma história; mantém traços de um fundo mítico que seremos capazes de rastrear se reconhecermos aspectos semânticos do luxo no contexto teológico, na idéia de Paraíso e no imaginário do Jardim do Éden. A constituição de uma marca de luxo “é inseparável da gestão simbólica de suas raízes, do trabalho de edificação de um mito. É através de referências a um passado mitificado, de legendas das origens que se moldam as grandes marcas” (LIPOVETSKY, 2005: 83).




De acordo com a especialista em marketing e gestão de marcas, Elyette Roux (2005), o que faz passar do “produto” a “marca” é, essencialmente, a dimensão e a notoriedade internacional; as marcas de luxo possuem ética e estética próprias, que lhes conferem identidade e legitimidade, remetendo benefícios simbólicos ao luxo, enquanto os produtos convencionais correspondem a benefícios funcionais; os clientes de luxo buscam experiências de emoções fortes, excepcionais; a análise e gestão criativa da identidade e da comunicação global de marca são algumas chaves para o sucesso neste segmento. O luxo consiste em não apoiar-se numa tendência, mas em criá-la, então Marketing e Criação se unem, de acordo com uma lógica de conjunção, orientação criativa e inovadora voltada ao cliente.


Na relação afetiva do consumidor com o luxo, o que interessa é sentir-se adequado com o uso de uma marca que reflete determinados valores. A manifestação do consumo de luxo não se dá de maneira programada, mas por impulso. Junto com a Moda, instala-se o luxo absolutamente moderno: superficial e gratuito, móvel e liberto das forças do passado e do invisível. Com o aparecimento da alta-costura, o luxo tornou-se uma indústria da criação e, com os processos de mecanização, surge o falso luxo de preço menor, voltado para as classes médias, para quem os preços e as coisas são a nova promessa de felicidade.



Nos anos 1980, as novas elites do mundo econômico ostentavam sem complexo seus gostos pelos produtos de luxo e pelos símbolos de posição social. Hoje, ainda persiste certo esnobismo, o desejo de parecer rico, o gosto de brilhar, a busca da distinção social pelos signos demonstrativos de identificação e distinção. No entanto, atualmente, os laços com a moda estão mais frouxos e triunfam o culto às marcas e aos bens raros. O narcisismo contemporâneo dominante não se move tanto pelo desejo de ser admirado, mas pelo desejo de se destacar da massa, de sentir-se um ser diferente, de construir uma imagem positiva para si próprio. Desse modo, o luxo está mais para a promoção de uma imagem pessoal do que de uma imagem de classe, e o consumo voltado para experimentar emoções estéticas ou sensitivas. É o reinado do luxo emocional, experimental e subjetivo.

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